A indústria do café representa uma das mais importantes cadeias de valor comercial a nível mundial. De facto, estima-se que sejam produzidas e consumidas, anualmente, cerca de 10 milhões de toneladas de café em todo o mundo.
Contudo, a produção e o consumo desta matéria-prima tão apreciada estão associados a vários problemas socioeconómicos e ambientais que têm prejudicado a sustentabilidade desta cadeia de valor.
Entre outros fatores, a obtenção de elevadas quantidades de subprodutos do café ao longo de toda a cadeia (cascara, polpa, mucilagem, pergaminho, pele de prata e borras de café), desde a colheita até ao copo, tem sido apontada como um dos principais desafios que a indústria do café enfrenta. Infelizmente, a gestão destes subprodutos não tem sido eficiente, representando um sério problema ambiental. A polpa e a pele de prata são os principais subprodutos que resultam da produção/ processamento pós-colheita e da torrefação do café, respetivamente. A polpa resulta da despolpagem do fruto do café através do método de processamento húmido.
Embora este método permita a obtenção de cafés com maior qualidade e valor económico, estima-se que sejam gerados cerca de 500 kg de polpa por tonelada de café verde obtido. Este subproduto resultante da produção e processamento pós-colheita é fundamentalmente descartado no ambiente, levando a efeitos nefastos nos ecossistemas devido à acumulação significativa de matéria orgânica e compostos fitotóxicos, pondo em risco a fauna e flora terrestre e marinha, inclusive as próprias plantações de café.
Por outro lado, a pele de prata, um tegumento fino que reveste o grão do café e que se desprende do mesmo durante o processo de torrefação, é gerada em quantidades significativamente inferiores, estimando-se que por cada tonelada de café torrado sejam obtidos cerca de 7,5 kg de pele de prata. Contudo, tendo em conta as quantidades de café que são consumidas anualmente e considerando que este subproduto é maioritariamente descartado em aterros, o seu impacto ambiental é igualmente significativo .
Para fazer face a estes problemas, têm sido realizados inúmeros estudos com o objetivo de valorizar e reutilizar estes subprodutos nas mais diversas áreas, desde a alimentar e farmacêutica à produção de fertilizantes, biocombustíveis e biocompósitos. Em particular, estes subprodutos apresentam um elevado potencial para serem reutilizados e aplicados nas indústrias alimentar, farmacêutica e nutracêutica devido à sua composição em nutrientes e compostos bioativos com efeitos benéficos reconhecidos: ação antioxidante, anti-inflamatória, antidiabética, anti-obesidade, hipolipidémica, prebiótica, hepatoprotetora, neuroprotetora e anticancerígena. Isto demonstra o elevado potencial destes subprodutos, sendo expectável que nos próximos anos este mercado possa crescer.
Contudo, apesar do seu reconhecido valor nutricional, a sua incorporação em formulações alimentares muitas vezes afeta negativamente o perfil sensorial dos produtos, comprometendo a aceitação do consumidor. No desenvolvimento de novos produtos é importante garantir que se cumprem as expectativas dos consumidores em termos de sabor, aroma e sensação na boca, características tão típicas destes produtos; é necessário considerar a sua validação sensorial.
Tendo em conta a procura crescente por alimentos funcionais e sustentáveis por parte dos consumidores, o presente estudo teve como objetivo desenvolver bolachas com incorporação de polpa e pele de prata em várias concentrações, a que se seguiu uma caraterização dos novos produtos (protótipos) do ponto de vista sensorial, bem como a avaliação de parâmetros físicos, como textura e cor. (...)
Por Juliana Peixoto, Carla Barbosa,Beatriz Oliveira, Rita Alves
REQUIMTE/LAQV, Departamento de Ciências Químicas,
Faculdade de Farmácia, Universidade do Porto
Fonte: TecnoAlimentar