Foi divulgado o relatório sobre o cultivo de transgénicos em todo o mundo publicado anualmente pelo Serviço Internacional para Aquisição de Aplicações em Agrobiotecnologia (ISAAA), um organismo financiado pelas indústrias da biotecnologia e engenharia genética.
O cenário cor-de-rosa e sem mancha apresentado pelo ISAAA, no entanto, choca directamente com a realidade e a rejeição demonstrada em todo o mundo por consumidores, agricultores, estados, regiões e concelhos, e até por empresas alimentares.
Alguns exemplos recentes mostram os problemas, bloqueios e recusas que o ISAAA se esquece de referir.
Embora o ISAAA transmita a ideia de que os transgénicos obtiveram adopção generalizada, o total de área cultivada com transgénicos representa menos de 2% do total mundial de área agrícola.
Além disso, 88% de toda a área cultivada com transgénicos está concentrada em apenas quatro países (Estados Unidos, Canadá, Argentina e Brasil).
Os primeiros transgénicos foram aprovados em 1994. Treze anos depois apenas duas características transgénicas (tolerância a herbicidas e resistência a insectos) e quatro espécies geneticamente alteradas (milho, soja, colza e algodão) são cultivadas de forma significativa nalguma parte do mundo.
Há milhares de zonas livres de transgénicos declaradas por todo o mundo, em particular na Europa.
Sete países da União Europeia proibiram variedades transgénicas autorizadas por Bruxelas devido aos riscos e incertezas associados à sua libertação no ambiente e consumo.
A Roménia, identificada como um dos "Mega-Países" que mais transgénicos cultivam (devido à sua produção de soja transgénica), proibiu já esse cultivo.
Em 2006, devido a três ondas de contaminação com diferentes variedades não-autorizadas de arroz transgénico, a Associação de Produtores de Arroz da Califórnia pediu a proibição de cultivo de qualquer tipo de arroz transgénico, incluindo ensaios de campo.
Os industriais de arroz dos dois maiores exportadores mundiais de arroz (Vietname e Tailândia) assinaram um acordo para se manterem livres de transgénicos.
O supremo tribunal indiano suspendeu, para já, todos os cultivos experimentais de transgénicos no país.
O governo chinês continua a impedir o cultivo comercial de arroz transgénico, apesar dos muitos esforços das empresas nesse sentido.
Mesmo as empresas mostram resistência global aos transgénicos. A Kraft Foods, a segunda maior empresa alimentar do mundo, começou a vender à China produtos exclusivamente não-transgénicos.
Na Rússia a empresa Sodruzhestvo, que fornece 70% de toda a soja usada em alimentos e rações naquele país, declarou-se livre de transgénicos.
Na Europa as maiores multinacionais do sector alimentar não vendem alimentos contendo transgénicos.
As estatísticas apresentadas pelo ISAAA apresentam falta de credibilidade e de rigor. Por exemplo:
Há um ano o ISAAA anunciava o cultivo comercial de arroz transgénico no Irão. O governo iraniano veio depois desmentir tal afirmação, uma vez que não há qualquer cultura transgénica autorizada no país.
Ainda no relatório do ano passado do ISAAA se afirmava que eram cultivados nas Filipinas 50 mil hectares de milho transgénico.
A fonte indicada era o próprio governo filipino que, no entanto, não possui quaisquer estatísticas oficiais sobre a matéria. A discrepância levou um governante a afirmar que aquele número era infundado.
O governo romeno anunciou que em 2005 tinham sido cultivados 87 mil hectares de soja transgénica no país. No entanto o ISAAA usou para esse país o valor de 125 mil hectares.
Mesmo em países com sistemas de estatísticas consolidados o ISAAA tende a inflacionar os números.
Nos Estados Unidos um estudo detalhado demonstrou que o ISAAA «engorda» os valores das áreas cultivadas em 2 a 9% relativamente aos números oficiais do Departamento de Agricultura.
O relatório de 2004 refere sete milhões de agricultores chineses que cultivam algodão transgénico. Em 2005 esse número já só atingia 6,4 milhões, sem qualquer explicação.
Em 2003 a Indonésia era anunciada como o 19º maior produtor mundial de transgénicos. Mas no ano seguinte este país nem sequer constava do mapa de produtores, mais uma vez sem qualquer explicação.
O ISAAA também se mantém silencioso no que toca a problemas de contaminação, processos judiciais contra agricultores provocados pela aplicação de patentes, aparecimento de ervas daninhas resistentes aos herbicidas aplicados nas culturas transgénicas, disfunções genéticas em variedades transgénicas, ou ainda sobre o custo económico dos sucessivos falhanços de uma tecnologia incontrolável e de má qualidade.
Fonte: AgroNotícias