Os viticultores da Região Demarcada do Douro estão a recorrer cada vez mais à selecção genética das suas castas para aumentarem a qualidade e quantidade dos seus vinhos e tornar as videiras mais resistentes aos vírus.
Em 1979 foi criada a Rede Nacional da Selecção da Videira, a partir de uma iniciativa do professor Antero Martins, do Instituto Superior de Agronomia, que contou com o apoio de Luís Carneiro, da Estação Agronómica Nacional, e de Nuno Magalhães, professor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD).
Depois de 28 anos de investigação no melhoramento das videiras existem 50 castas em selecção.
"Na década de setenta não existia em Portugal uma selecção colonal das videiras, inclusive, nesta altura, a produção era muito baixa", afirmou Nuno Magalhães.
Em Portugal a produção de vinho rondava os 30 hectolitros por ano, na França era de 70 e na Alemanha de 120 hectolitros.O objectivo da investigação foi seleccionar, de cada casta, os clones mais resistentes aos vírus, com mais produção e mais qualidade, e determinar aqueles com mais açúcar ou mais tintos.
Actualmente, a maior parte das grandes empresas produtoras de vinho já plantam as suas vinhas com material seleccionado.
A Real Companhia Velha (RCV), com quatro quintas instaladas em plena Região Demarcada do Douro, fez a primeira plantação com videiras seleccionadas há 10 anos.
Segundo um dos engenheiros da RCV, Rui Soares, actualmente a empresa possui 50 hectares de vinha, de um total de 500, plantados com material seleccionado.
"E nas próximas plantações vamos privilegiar a selecção colonal", afirmou.
Entre Fevereiro e Março, a RCV vai iniciar plantação de mais três hectares, na Quinta dos Aciprestes, e cinco hectares, na Quinta das Carvalhas, localizadas na região do Douro.
"Estamos a utilizar material que oferece garantias quanto à despistagem de vírus, mais qualidade e mais produção", salientou.
Para Rui Soares, a utilização de melhores castas equivale a uma produção de melhores uvas e, consequentemente, de melhores vinhos.
A Sogrape-Vinhos começou a plantar videiras seleccionadas em 1988 e, actualmente, nos cerca de 500 hectares de vinha que possui no Douro, a empresa tem cerca de 100 hectares com estas castas, das quais se destacam a Touriga Nacional, a Touriga Franca, a Tinta Barroca, a Tinta Roriz ou o Tinto Cão.
O primeiro passo do projecto, iniciado no final da década de 70, foi a escolha dos "pés mãe" da Touriga Nacional, uma casta que, segundo Nuno Magalhães, era "muito boa mas que produzia muito pouco", pelo que estava quase extinta.
Efectuou-se uma prospecção em várias quintas, em todo o país, e recolheram-se entre 200 a 300 pés das melhores videiras, que foram colocados em dois campos de experimentação, um na zona do Dão e outro na região transmontana da Vilariça.
Nesta segunda fase, foram seleccionados 30 a 40 pés segundo os critérios sanitários - de produção e de qualidade - os quais passaram para um segundo campo de experimentação, onde já se verificou trabalho de laboratório e se separaram as variações genéticas das ambientais, de forma a encontrar os melhores clones que fossem também mais resistentes ao factor climatérico.
"Foram seleccionados entre oito a 12 clones que foram colocados em campos de multiplicação e, através deles, fizeram-se os enxertos prontos que são plantados nas vinhas", frisou o responsável.
Um dos maiores sucessos da selecção colonal foi, segundo Nuno Magalhães, a Touriga Nacional que estava quase extinta e agora foi reposta nas vinhas.
"Até já foi plantada em vinhas na Argentina, Africa do Sul e Austrália", disse.
Nuno Magalhães considera que, no início do projecto, houve uma grande dinamização em Portugal e que o projecto foi alargado a mais castas e mais regiões.
"Foi um trabalho conjunto de muitos técnicos e organismos, que contou com o apoio essencial dos viticultores privados, que deixaram recolher nas suas vinhas os pés mãe e, depois, instalá-los em campos de experimentação", salientou.
Para o responsável, com este projecto "foi possível recuperar as castas e tornar a produção mais regular e com mais qualidade", faltando, agora, "institucionalizar todo o trabalho".
Para Nuno Magalhães, a solução poderia passar pela criação de uma associação que "tome em mãos o projecto de selecção colonal das castas".
O professor considera ainda que Portugal é um dos países onde a investigação da selecção colonal "está mais evoluída cientificamente".
Segundo disse, no início dos trabalhos seguiu-se a metodologia francesa, que "era mais restritiva", ou seja apostava mais nos aspectos sanitários e menos nos genéticos, o que diminuía a biodiversidade.
"Por isso verificou-se que era necessário alterar a metodologia e apostar mais na variabilidade genética de cada casta. Cada uma está dividida em vários clones de cor, açúcar ou quantidade", frisou.
Das 320 castas portuguesas, 50 estão neste momento em selecção.
Rui Soares considera que ainda existe falta de divulgação da selecção colonal da videira e, ao contrário do que grande parte dos pequenos e médios viticultores pensa, o preço de um enxerto pronto de material seleccionado é equivalente ao de um enxerto pronto de material convencional.
Os enxertos prontos plantados nas vinhas são provenientes directamente da rede nacional de selecção ou dos viveiristas.
"Ainda há muito desconhecimento", salientou o engenheiro.
Admitiu, no entanto, que o balanço do material seleccionado "é muito positivo".
Fonte: Agronotícias