Algumas culturas europeias de importância vital, como as vinhas e as azeitonas, estão a ser devastadas por doenças. Os cientistas estão à procura de substitutos biológicos para os pesticidas químicos de forma a melhorar as culturas e a saúde humana.
A ameaça à agricultura por parte das espécies invasoras é enorme. As Nações Unidas (ONU) estimam que as doenças das plantas custam à economia mundial mais de € 200 mil milhões por ano, com 20-40% da produção das culturas perdidas devido a pragas.
“A perda económica das espécies invasoras é imensa, e se não tomássemos qualquer medida, haveria uma enorme insegurança alimentar, não só em toda a UE mas em todo o mundo”, afirmou a Dr.ª Hikmate Abriouel, professora de microbiologia na Universidade de Jaén, na Andaluzia em Espanha.
Com apostas tão altas, é fácil compreender porque é que o setor agrícola é um dos maiores utilizadores de produtos químicos a nível mundial.
Hoje em dia, a questão da segurança alimentar é o mais importante. Porém, como a Dr.ª. Abriouel continua a explicar, a nossa crescente relutância em utilizar produtos químicos na agricultura acrescenta uma série de complicações à agricultura.
“Houve uma altura em que era normal depender de pesticidas fortes para tratar as terras agrícolas”, referiu ela. “Mas agora sabemos que um produto químico concebido para matar um organismo vivo é também suscetível de ter impactos negativos noutros sistemas biológicos.”
A pulverização de culturas com compostos sintéticos tem impactos adversos nas pessoas, animais de criação, fauna selvagem, polinizadores, como as abelhas, e outros seres vivos que desempenham um papel essencial no ecossistema. O derramamento químico também danifica a terra e a água.
Risco de poluição
A poluição causada pelos pesticidas origina riscos para as terras agrícolas, devido aos resíduos químicos que se infiltram nas reservas de água.
Alguns pesticidas sintéticos foram associados a doenças humanas como o cancro, doenças do sistema imunitário e doenças respiratórias.
Os produtores que trabalham com pesticidas estão particularmente vulneráveis a efeitos secundários, estimando-se que 44% dos trabalhadores agrícolas em todo o mundo vivenciam pelo menos um incidente de intoxicação aguda por pesticidas todos os anos.
A estratégia da UE “Farm to Fork” (F2F – Da quinta para a mesa) direcionada para uma produção alimentar sustentável visa reduções significativas na utilização de pesticidas químicos, fertilizantes e antimicrobianos e apoia o aumento da agricultura biológica. No que diz respeito aos objetivos da sustentabilidade significa que são necessários biopesticidas ou alternativas biológicas aos pesticidas.
“Existem muitas evidências de que a substituição de produtos químicos por biopesticidas funciona com a natureza e não contra ela”, afirmou a Dr.ª. Abriouel. As soluções biológicas também favorecem a saúde do solo e a biodiversidade.
Vinhas em extinção
Só em França, cerca de 12% das vinhas foram improdutivas entre 2012 e 2017 devido à Doença do Tronco da Videira (DTV) que se tem espalhado pela Europa ao longo das últimas duas décadas. Foi proibida a utilização de um pesticida químico para tratar a vinha, uma vez que é prejudicial para a saúde humana e ambiental.
A doença resulta em plantas 50% menos produtivas, numa diminuição da qualidade do vinho e na morte prematura de vinhas saudáveis. A nível mundial, estima-se que o custo de substituição das videiras excede os € 1,4 mil milhões por ano.
Como resposta a este flagelo, a UE está a financiar o projeto multinacional BIOBESTicide, que visa encontrar uma solução biológica para a DTV.
“O nosso objetivo é desenvolver uma solução preventiva realmente eficaz e totalmente natural para este problema muito sério e muito dispendioso”, referiu a Dr.ª Assia Dreux-Zigha, que trabalha para a empresa francesa de biotecnologia Greencell e coordena a investigação BIOBESTicide.
O trabalho de investigação da equipa centra-se numa estirpe específica do Pythium oligandrum, um fungo “amigável” que está naturalmente presente na rizosfera de muitas plantas cultivadas, incluindo as vinhas. A rizosfera é a região do solo rica em microrganismos diretamente à volta das raízes de uma planta.
O P. oligandrum funciona tanto pela destruição direta de parasitas como pela indução de resistência das plantas contra novos ataques. Depois de isolar o P. oligandrum no laboratório, a Greencell e os seus parceiros descobriram que, sob certas condições, o biopesticida colonizou as raízes das videiras e estimulou as defesas naturais da planta contra a DTV.
Num futuro próximo, após os ensaios e a aprovação de segurança, os investigadores da BIOBESTicide têm como objetivo expandir e testar o seu biopesticida no terreno em vinhas localizadas em diferentes áreas geográficas.
“Este é um projeto muito desafiante mas, quando terminarmos no final de 2023, esperamos ter uma solução que possibilite a sobrevivência das videiras durante todo o seu ciclo de vida natural”, referiu a Dr.ª Dreux-Zigha.
Sem dúvida alguma, os viticultores brindarão a esta perspetiva.
Conservador das oliveiras
A segunda cultura icónica europeia que precisa urgentemente de uma solução biopesticida é a oliveira. Detetada pela primeira vez nas oliveiras europeias em 2013, a síndrome do declínio rápido da azeitona (OQDS) é uma doença causada pela bactéria Xylella fastidiosa.
Na Apúlia, sul de Itália, onde a Xylella surgiu pela primeira vez no continente, a produção de azeitonas diminuiu 65-80% nos anos anteriores a 2020 com a perda de cerca de 100.000 postos de trabalho e a destruição de oliveiras históricas com 400 anos.
A Xylella apareceu em França, Espanha e Portugal, disseminada por um inseto chamado cigarrinha. As plantas afetadas são infetadas a partir das raízes, fazendo com que as folhas fiquem castanhas e acabando, eventualmente, por destruir a planta. É considerada uma das bactérias patogénicas vegetais mais perigosas do mundo.
“O problema com este agente patogénico está a agravar-se”, afirmou a Dr.ª Abriouel, que supervisiona o projeto SMART-AGRI-SPORE apoiado pela UE, que visa desenvolver um biopesticida com base em esporos bacterianos.
“Prevenir a propagação desta praga é uma prioridade na UE”, expressou ela. Um estudo de 2020 estimou que, na pior das hipóteses, apenas a Itália perderia entre € 1,9 mil milhões e 5,2 mil milhões num período de 50 anos, como resultado da OQDS.
Existem vários projetos a desenvolver biopesticidas para atacar a Xylella. A investigadora principal Dr.ª Julia Manetsberger, sob a supervisão da Dr.ª Abriouel, está focada na modificação de uma estirpe de outra bactéria de forma a torná-la mortal para a Xylella.
Os investigadores têm esperança de que até 2024 surja um biopesticida eficaz desta investigação.
“Não podemos usar algo contra a Xylella que altera a biodiversidade ou destrói ou aumenta a resistência dos microrganismos presentes noutras plantas e no solo”, referiu a Dr.ª Abriouel. “Por outras palavras, não podemos resolver um problema e criar outro.”
“Estamos a trabalhar arduamente para atingir este objetivo”, afirmou a Dr.ª Manetsberger, “Estas plantas são importantíssimas para a nossa economia e precisamos de as proteger.”
Fonte: Agroportal