Nos escaparates dos supermercados expõe-se a grande diversidade de proveniência dos produtos alimentares no que diz respeito à origem geográfica e ao modo como são produzidos. O consumidor é frequentemente colocado perante o dilema de ter de escolher entre um produto que “viajou” quilómetros para ali chegar, mas que a certificação biológica assegura que foi produzido de forma a minimizar os impactos negativos no ecossistema agrícola e um produto da agricultura convencional, considerada menos “amiga do ambiente”, ainda que seja de produção local ou nacional e mais barato. Perante este dilema hipotético, qual é a opção mais sustentável? A resposta não é simples nem absoluta, na verdade depende do balanço entre vários fatores.
Antes de mais, não existem produtos, agrícolas ou industriais, sem qualquer tipo de impacto. Fala-se de um produto mais sustentável, porque estamos sempre a falar em comparação com outros idênticos, tendo em conta todo o ciclo de vida, desde a produção, transporte, uso e o seu destino final.
Consideremos a primeira opção:
A Agricultura Biológica é um modo de produção que visa produzir alimentos de elevada qualidade, saudáveis, enquanto promove práticas sustentáveis e de impacto positivo no ecossistema agrícola:
– Não recorre à aplicação de pesticidas e adubos de síntese química sobre as culturas, nem ao uso de organismos geneticamente modificados;
– A produção animal biológica orienta-se por normas de ética e respeito pelo bem-estar animal, não recorre ao uso de hormonas nem antibióticos como promotores de crescimento;
– Recorre a métodos preventivos e culturais que fomentam a melhoria da fertilidade do solo e a biodiversidade, tais como rotações de culturas, adubação verde, compostagem, consociações, instalação de sebes vivas, controlo biológico de pragas e doenças, entre outros.
A qualidade dos produtos biológicos é assegurada pelo selo de certificação fornecido por entidades reguladoras, acreditadas pelo governo, que verificam e fiscalizam os alimentos biológicos desde a produção até à sua comercialização.
No entanto, há cada vez mais entidades a certificar a sustentabilidade de um produto, mas nem todas são credíveis. O fenómeno do “greenwashing” que recorre a conceitos ambientais falsos como argumento de venda está claramente em ascensão, a falta de legislação em matéria de “greenwashing” e de fiscalização aumentam o risco da garantia de sustentabilidade de um produto ser falsa. A solução para contornar o logro é procurar produtos com rótulos ecológicos reconhecidos.
É preciso ter em conta que produtos não certificados inclui muita coisa, desde o modelo agroindustrial baseado em monoculturas, agricultura de precisão, a modelos agroecológicos (que usam práticas agrícolas regenerativas com impacto positivo sobre os ecossistemas), ou seja, desconhecendo ao certo de onde vem e como foi produzido, o produto não certificado é um “tiro no escuro”. Quando o grau de desconhecimento do consumidor face a dois produtos é igual, é preferível optar pelo que tem uma certificação credível. Sobretudo se for um alimento produzido no espaço europeu, sujeito às normas europeias. Certas proveniências e certos produtos podem ter mais risco de estarem associados a impactos negativos como a desflorestação, por exemplo o milho ou a soja proveniente da América do Sul ou o cacau da Costa do Marfim.
No que diz respeito à distância que os alimentos têm de percorrer até chegar ao consumidor, o impacto do transporte de mercadorias a nível mundial é dos mais negativos para o meio ambiente, aumentando muito a pegada ecológica dos sistemas alimentares:
– Grande consumo de energia, a maior parte petróleo;
– Libertação de gases com efeito de estufa (GEE) para a atmosfera;
– Causador de poluição – atmosférica, aquática e sonora.
Quanto menor for a distância a ser percorrida entre o produtor e o consumidor e menor a pegada ecológica do meio de transporte, mais sustentável se torna a cadeia alimentar.
Por oposição à agricultura biológica, a agricultura convencional, mais industrializada, é considerada menos ecológica e com mais impactos negativos para o ambiente:
– Usa métodos que depletam os recursos e a biodiversidade;
– Não beneficia os processos ecológicos e os serviços dos ecossistemas;
– Dependente de inputs externos permanentes de pesticidas e fertilizantes de origem sintética que prejudicam a salubridade dos recursos (água, solos, biodiversidade auxiliar, etc.), a saúde da mão-de-obra e dos consumidores;
– Grande produção de resíduos pouco recicláveis e maior emissão de GEE.
Mas nem tudo são desvantagens. Não há evidências de que haja uma diferença nutricional entre alimentos provenientes da agricultura biológica e os provenientes da agricultura convencional.
A ZERO aponta para a importância de um consumo local, sazonal, de proximidade e em cadeias curtas, com conhecimento sobre as pessoas e os processos que geraram o alimento. Neste contexto, proximidade e cadeias curtas não têm a ver apenas com distância, mas também com o conhecimento sobre o modo como os alimentos são produzidos e os impactos a vários níveis, com maior controlo sobre a qualidade intrínseca do alimento. Cadeias curtas referem-se especificamente a cadeias que têm até um intermediário entre o produtor e o consumidor, independentemente da distância percorrida.
A Agricultura de Proximidade é hoje reconhecida como um dos eixos mais importantes para a sustentabilidade da cadeia alimentar, tanto por permitir a diminuição da pegada ecológica da agricultura como pelos múltiplos contributos socioeconómicos:
– Promoção dos produtos locais;
– Contribui para a segurança alimentar;
– Revitaliza as comunidades agrícolas e promove a estabilidade das comunidades rurais;
– Aumenta a soberania alimentar;
– Permite a redução dos transportes a nível mundial e redução da emissão de GEE;
– Permite a manutenção das explorações agrícolas e dos rendimentos regionais com a criação de um mercado local.
A concretização de uma Agricultura de Proximidade só acontece com a organização entre agricultores e consumidores em grupos de consumo e produção agroecológica.
A Regenerar – Rede Portuguesa de Agroecologia Solidária é o ponto de encontro em Portugal entre estes grupos formados por parcerias entre produtores e consumidores, conhecidos como AMAP (Associações para a Manutenção da Agricultura de Proximidade) ou CSA (Comunidades que Sustentam a Agricultura), onde os riscos, responsabilidades e recompensas inerentes à produção agrícola são partilhadas, permitindo aumentar assim a proximidade e dissolver um pouco a divisão tão marcada de papéis inerente ao modelo convencional de distribuição de alimentos.
Fonte: ZERO