Os projectos de Lei dos Verdes e do Bloco de Esquerda para suspender as culturas transgénicas foram rejeitados hoje no Parlamento, com os votos contra do PS e PSD, a favor do PCP e a abstenção do CDS-PP.
Na bancada do PSD houve duas abstenções e o deputado Mendes Bota, a voz mais crítica entre os sociais-democratas face ao Decreto-Lei do Governo que autoriza o cultivo de milho geneticamente modificado, anunciou que vai apresentar uma declaração de voto, tendo três dias para o fazer.
Durante o debate, a oposição criticou a ausência do Governo, que aprovou em Conselho de Ministros, em Abril, a autorização destas culturas.
Toda a oposição manifestou dúvidas e receios de contaminação de organismos geneticamente modificados sobre as culturas tradicionais e eventuais consequências no ambiente e saúde, alegando falta de estudos aprofundados, de regulamentação e de um amplo debate nacional.
Os deputados da oposição queixaram-se de não terem ainda conseguido ter acesso ao Decreto-Lei do Governo na íntegra e acusaram o Executivo PS de secretismo e cedência às grandes multinacionais que exploram o negócio dos Organismos Geneticamente Modificados (OGM).
Mendes Bota foi um dos deputados que questionou o PS sobre quando vai estar regulamentada a questão das zonas livres de transgénicos, indicando que Tavira e Aljezur declararam já que querem ser municípios livres de OGM.
O fundo de compensação para eventuais riscos dos agricultores com uma possível contaminação de culturas foi outra questão levantada pela oposição, para a qual não há ainda resposta.
Mendes Bota sublinhou que o Algarve é uma região onde a agricultura biológica está implantada e defendeu a necessidade de um debate nacional para esclarecer a população, bem como a criação de um livro branco sobre a matéria.
Já para o seu colega de bancada Ricardo Martins, a quem coube a comunicação ao plenário, o PSD concorda genericamente com o diploma do Governo, mas sugere algumas melhorias.
Entre as propostas que apresentou para aperfeiçoar o diploma aprovado em Conselho de Ministros e ainda não promulgado pelo Presidente da República, Ricardo Martins avançou com a introdução de OGM de forma faseada e em zonas muito restritas, com acompanhamento.
O deputado considerou que os OGM são uma realidade e uma inevitabilidade, que pode ser uma mais-valia para a agricultura portuguesa.
O PSD reclamou a urgente regulamentação e definição das zonas de cultivo e das zonas livres de transgénicos, sugerindo estas últimas em regiões de relevante valor ambiental.
Relativamente às distâncias de segurança, também o PSD discorda do enunciado pelo Governo, afirmando que 24 linhas de bordadura "não conseguem evitar a contaminação" entre culturas e que será certamente "um lapso do comunicado" do Governo.
Em respostas aos receios de contaminação e riscos para a saúde, o deputado do PS Carlos Laje afirmou que toda a legislação que os Verdes e o Bloco de Esquerda querem suspender é "legislação europeia, uma armadura jurídica, que levou anos a elaborar".
O CDS-PP citou um estudo realizado na União Europeia, segundo o qual 95% dos europeus não quer consumir transgénicos.
De acordo com o deputado centrista João Rebelo, os sacos de milho transgénico são 12% mais caros do que o milho convencional e têm uma fraca procura no mercado.
Em seu entender, os agricultores portugueses que pretendam cultivar milho transgénico vão ter dificuldades em escoar a produção no mercado.
Jaime Silva, ministro da Agricultura, anunciou em Abril que Portugal seguiu o exemplo da Lei dinamarquesa na decisão de impor uma distância mínima de 200 metros entre as culturas convencionais e as geneticamente modificadas.
Porém, hoje o PCP lembrou que a realidade da agricultura portuguesa nada tem a ver com a daquele país, "baseada essencialmente em grandes campos de cultivo" e efectuada "com recurso a alta tecnologia", sendo "bastante desenvolvida".
"Por que não escolher o modelo seguido na Alemanha, que prevê a separação de um quilómetro entre culturas de OGM e culturas convencionais?", questionou o deputado comunista Miguel Tiago, que ficou sem resposta a esta questão, num debate com cerca de duas horas.
ONU: Há Pressões Contrárias para Organismos Geneticamente Modificados
Um relatório da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (Unctad), hoje divulgado, aponta que os potenciais produtores agrícolas de organismos geneticamente modificados (OGM) estão sujeitos a pressões diferentes e contraditórias.
Estas pressões concentram-se nos países em vias de desenvolvimento, particulariza a instituição, os quais têm de considerar pressões de vários origens e com vários impactos.
Entre as mencionadas estão a procura de um equilíbrio entre atalhar a fome e má nutrição dentro das suas fronteiras, garantir saúde e segurança, preservar o ambiente, cumprir obrigações multilaterais no comércio internacional e proteger e reforçar oportunidades comerciais.
A agência da ONU acrescenta que estas escolhas são particularmente difíceis para as nações mais pobres.
Se a agro-biotecnologia, por um lado, aumenta o rendimento e lucro para os agricultores e reduz a escassez de alimentos, por outro pode ameaçar práticas agrícolas tradicionais, limitar o acesso a sementes, colocar problemas imprevisíveis à saúde e ao ambiente, prejudicar a biodiversidade e causar preocupações étnicas e religiosas.
Acresce que estes países podem sair a perder nas suas trocas internacionais, uma vez que se pretenderem manter as suas exportações para a União Europeia, onde os consumidores estão cépticos quanto às culturas de transgénicos, terão de manter o estatuto de “livre de OGM”.
Isto implica não só não exportar OGM como nem sequer usá-los no consumo doméstico ou importá-los sequer, acentua a Unctad.
A preocupação de perder mercados já levou alguns países, como Angola, Etiópia, Lesoto, Malawi, Sudão, Zâmbia e Zimbabué, a banirem importações de OGM, com algumas excepções relativas a ajudas alimentares.
A área mundial afecta à plantação de OGM foi multiplicada por 47 desde 1996, mas a sua localização nos países em desenvolvimento é reduzida.
Os EUA representam 59% dos 81 milhões de hectares dedicados à agricultura de OGM em 2004.
A área restante está espalhada por mais 16 países, com a Argentina a representar 20 por cento, Canadá e Brasil (6 por cento cada), China (5 por cento), Paraguai (2 por cento), e Índia e África do Sul, com 1% cada.
Fonte: Lusa