As cardosinas, presentes na flor do cardo, são essenciais para a produção do queijo da serra e estão a ser estudadas por investigadores da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP) e do GreenUPorto – Centro de Investigação em Produção Agroalimentar Sustentável, no âmbito do ProCardo, um projeto que visa ajudar a proteger a qualidade do queijo da Serra da Estrela.
O objetivo desde projeto inovador é ajudar os produtores a tirar maior partido das cardosinas – enzimas que funcionam como coagulante vegetal (“coalho”) – na produção deste queijo e que lhe conferem características únicas e uma identidade exclusiva.
A decorrer até 2026, o ProCardo – Caracterização das proteinases aspárticas de Cardo na promoção do Queijo da Serra da Estrela – pretende ainda perceber de que forma é que os efeitos das alterações climáticas podem afetar a expressão e atividade das cardosinas de forma a auxiliar a indústria queijeira a preservar a qualidade do Queijo da Serra da Estrela.
Em Portugal, os cardos ocorrem na orla interior do país desde a Serra da Estrela até ao Algarve. De uma maneira geral, as flores utilizadas na produção do Queijo da Serra da Estrela são provenientes do Sul do país, zona muito suscetível aos efeitos da seca e do calor excessivo numa tendência crescente face às alterações climáticas.
Alterações climáticas: uma ameaça para o queijo da serra?
É precisamente isso que os investigadores querem perceber e dotar a indústria queijeira com a capacidade de poder ultrapassar eventuais alterações das características das cardosinas nas flores de cardo.
“Existem dois tipos de cardosinas importantes no coagulante vegetal, a A e a B. Estas enzimas têm propriedades diferentes na sua ação, que é cortar a principal proteína do leite – a caseína – e promover a sua coagulação”, começa por explicar Cláudia Pereira, investigadora da FCUP e do GreenUPorto, responsável pelo projeto.
“Sabemos que a proporção entre cardosina A e B é muito importante para que o queijo mantenha as suas características. Há uma que é mais específica nos cortes que faz nos diferentes tipos de caseína e uma outra que corta mais intensamente as cadeias peptídicas das caseínas e isso vai ter efeitos na qualidade do queijo”, acrescenta.
Ensaios e próximos passos
No PSIlab na FCUP, os investigadores estão a estudar como varia a expressão daquelas enzimas consoante diferentes tipos de stress ambiental.
Os primeiros ensaios de campo já permitiram à equipa do projeto perceber que há diferenças na proporção das cardosinas produzidas em plantas expostas a temperaturas elevadas relativamente às produzidas nas plantas em situação de conforto hídrico.
“Normalmente nas flores de cardo temos maior quantidade de cardosina A do que cardosina B, mas em plantas expostas a temperatura mais elevada as proporções tendem a igualar-se”, adianta Cláudia Pereira.
A equipa está atualmente a realizar ensaios de campo em Viseu, em situações de stress hídrico e de conforto hídrico. Esses resultados serão comparados com os de ensaios realizados em plantas no Alentejo, nomeadamente em Beja, onde, em estufa, estão sujeitas a temperaturas elevadas.
Depois desta fase do projeto, os investigadores vão selecionar algumas condições mais extremas, em função dos ensaios de campo, obter flores colhidas nessas condições e utilizá-las na produção de Queijo da Serra da Estrela DOP. “Esse queijo será analisado em relação às características físico-químicas em laboratório e pelo painel da câmara de provadores do Queijo Serra da Estrela DOP, para avaliação sensorial quanto à textura, sabor e aroma”, conta Cláudia Pereira.
A última fase do ProCardo será a divulgação, através da realização de workshops, dos resultados do projeto junto da indústria queijeira. A primeira ação decorreu em fevereiro passado, durante a 23.ª Feira do Queijo de Serpa. Está igualmente prevista uma colaboração com produtores espanhóis que poderão também ter acesso e beneficiar deste conhecimento científico.
Fonte: FCUP