Portugal continua a desperdiçar recursos com elevado valor energético e ambiental. Segundo a Associação de Bioenergia Avançada (ABA), o país precisa de reforçar a recolha e valorização dos resíduos alimentares, em particular dos óleos alimentares usados (OAU), para produzir biocombustíveis avançados — uma das soluções mais eficazes para reduzir as emissões do setor dos transportes.
De acordo com dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), o país desperdiça cerca de 1,93 milhões de toneladas de alimentos por ano, o equivalente a 182,7 kg por habitante. As famílias são responsáveis por mais de dois terços deste desperdício, o que reforça a necessidade de maior sensibilização e educação ambiental.
Recolha de óleo alimentar usado ainda é residual
Um dos exemplos mais evidentes deste problema é o baixo aproveitamento do óleo alimentar usado, um resíduo comum nas cozinhas portuguesas, mas com grande potencial energético.
Segundo um relatório da ZERO, a média nacional de recolha nos municípios com mais de 100 mil habitantes é de apenas 0,11 litros por pessoa/ano. Mesmo os concelhos com melhor desempenho — Maia, Seixal, Oeiras, Matosinhos e Amadora — recolhem entre 0,18 e 0,29 litros, enquanto os piores casos não ultrapassam 0,06 litros.
“A reciclagem de óleos alimentares usados é um exemplo claro de economia circular em ação. Quando corretamente encaminhado, este resíduo pode ser transformado em biocombustíveis avançados, reduzindo as emissões de CO₂ até 90% face aos combustíveis fósseis”, explica Ana Calhôa, secretária-geral da ABA.
A responsável recorda ainda o impacto ambiental da má gestão destes resíduos: “um litro de óleo pode poluir cerca de um milhão de litros de água”.
De resíduo a recurso: uma cadeia de valor sustentável
A transformação dos óleos alimentares usados em biocombustíveis envolve várias etapas — recolha, tratamento, refinação e utilização final em transportes públicos, frotas rodoviárias e aviação.
Em 2024, este subproduto representou 22% da matéria-prima utilizada na produção nacional de biocombustíveis, segundo o relatório anual da ABA, consolidando o seu papel na diversificação da matriz energética portuguesa.
“Portugal tem uma oportunidade estratégica de potenciar a recolha de óleos alimentares e integrá-la numa visão mais ampla de descarbonização do transporte. Ao transformar resíduos em energia limpa, reduzimos simultaneamente a poluição, a dependência energética externa e o desperdício”, reforça Ana Calhôa.
Biocombustíveis e metas europeias
A ABA lembra que a produção de biocombustíveis a partir de matérias-primas residuais — como óleos usados, gorduras animais e subprodutos alimentares — é uma das vias mais eficientes para atingir as metas europeias de energia renovável no setor dos transportes até 2030.
Para alcançar esse objetivo, a associação defende três prioridades estratégicas:
“Cada litro de óleo conta”
No Dia Mundial da Alimentação, assinalado ontem, 16 de outubro, a ABA lança um apelo à responsabilidade coletiva — de consumidores, empresas e autarquias — para reduzir o desperdício alimentar e reciclar corretamente o óleo usado.
“São gestos simples com um impacto ambiental profundo. Cada litro de óleo reciclado é um passo para a produção de energia limpa, a redução da poluição e o fortalecimento da economia circular em Portugal”, conclui Ana Calhôa.
Fonte: Grande Consumo